Seleção de células ligadas em paralelo

 

SELEÇÃO DE CÉLULAS LIGADAS EM PARALELO

 

Ao montar packs de baterias com células de lítio íon, é comum conectar várias células em paralelo. Quando as células são conectadas em paralelo e cicladas a uma taxa alta de corrente, a equalização da resistência interna é importante para garantir uma vida útil longa da bateria.

A diferença na resistência interna das células ligadas em paralelo, se torna um problema importante para aplicações em que a bateria está sujeita a altas taxas C, e é necessário ter uma vida útil longa de muitas centenas a dezenas de milhares de ciclos. Exemplos dessas aplicações incluem veículos híbridos e baterias de ferramentas elétricas.

 

O efeito prejudicial da incompatibilidade de resistência interna entre células conectadas em paralelo surge porque a diferença na resistência interna leva à distribuição desigual de corrente dentro das células e as correntes inesperadamente altas resultantes diminuem a vida útil da bateria.

Supondo que duas baterias estejam ligadas em paralelo, a tensão em ambas as baterias será exatamente a mesma, logo após o transitório inicial de corrente.

Se houver um desequilíbrio de 20% na resistência interna das duas baterias haverá também um desequilíbrio nas respectivas correntes quando essas células forem recarregadas ou descarregadas.

 

Para ilustrar o problema, vamos imaginar um exemplo teórico. Na prática os valores reais podem ser bem diferentes dos que serão mostrados aqui.

Na prática existem outros fatores não considerados aqui, tais como efeito da temperatura no desempenho de cada célula, capacidades diferentes de cada célula, resistências ôhmicas das conexões do pack de baterias e outros fatores, mas mesmo assim, o exemplo teórico e bastante útil para mostrar a questão do desequilíbrio de correntes nas células ligadas em paralelo.

 

 
Figura 1 - Ligação paralela na carga

 

Por exemplo, na figura 1, se R1 = 10 m?, R2 = 15 m? e a tensão inicial no carregador for de 3,1V e a tensão inicial das baterias for de 3V, teremos as seguintes correntes de recarga em cada bateria:

 

 - Corrente na célula 1: I1 = (3,1-3) / 0,010 = 10 A

 

 - Corrente na célula 2: I2 = (3,1-3) / 0,015 = 6,66 A

 

Ou seja, na recarga, o desequilíbrio nas correntes das duas células será de 3,33 A. A distribuição de corrente nas células conectadas em paralelo normalmente não é monitorada em baterias comerciais, a fim de reduzir a complexidade do pack de baterias e o custo da placa BMS.

A diferença na resistência interna em células conectadas em paralelo, também leva a um desequilíbrio ainda maior na corrente no fim do ciclo de descarga.

Na figura 2 supondo as baterias em início de descarga, vamos imaginar a seguinte situação:

 

 - Início de descarga:

 

Célula 1: Resistência Interna R1 = 10 m?

Célula 2: Resistência Interna R2 = 15 m?

Corrente de saída do pack de baterias = 50 A

Tensão VB1 = 4,2V

Tensão VB2 = 4,2V

I1 = Corrente na célula 1

I2 = Corrente na célula 2

VR1 = Tensão em R1

VR2 = Tensão em R2

 

 
Figura 2 - Ligação paralela no início da descarga

 

Temos as seguintes equações:

 

I1 + I2 = 50 ou I1 = 50 – I2 (equação 1)

VB1 - VR1 = VB2 - VR2 (equação 2)

 

Pela lei de ohm: VR1 = R1 x I1 e VR2 = R2 x I2

 

Então podemos reescrever a equação 2 da seguinte forma:

 

VB1 - R1 x I1 = VB2 - R2 x I2

4,2 - 0,010 x I1 = 4,2 - 0,015 x I2

 

Usando a equação 1 temos:

 

4,2 - 0,010 x (50-I2) = 4,2 - 0,015 x I2

4,2 – 0,5 + 0,010 x I2 = 4,2 - 0,015 x I2

3,7 + 0,010 x I2 = 4,2 – 0,015 x I2

0,025 x I2 = 4,2-3,7

I2 =0,5 / 0,025 = 20 A

 

I1 = 50 – I2 = 50 – 20 = 30 A

 

Ou seja, há um desequilíbrio inicial na corrente de 30 A – 20 A = 10 A entre as duas células.

A tensão na carga Vc pode ser calculada por:

Vc = VB1 – R1 x I1 = 4,2 – 0,01 x 30 = 3,90 V

 

ou

 

Vc = VB2 – R2 x I2 = 4,2 – 0,015 x 20 = 3,90 V

 

A resistência da carga Rc pode ser calculada por:

 

Rc = Vc / I = 3,90 / 50 = 0,078 ?

 

 - Fim de descarga:

 

Supondo uma tensão de final de descarga de 3V para ambas as células, então teríamos:

 

Célula 1: Resistência Interna R1 = 10 m?

Célula 2: Resistência Interna R2 = 15 m?

Corrente de saída do pack de baterias em fim de descarga = Ic

Tensão na carga=Vc

Tensão VB1 = 3,0V

Tensão VB2 = 3,0V

I1 = Corrente na célula 1

I2 = Corrente na célula 2

VR1 = Tensão em R1

VR2 = Tensão em R2

 

 

Figura 3 - Ligação paralela no final da descarga

 

Temos as seguintes equações:

VB1 – R1 x I1 = (I1 + I2) x Rc (equação 1)

3,0 – 0,010 x I1 = (I1 + I2) x 0,078

3,0 – 0,010 x I1 = 0,078 x I1 + 0,078 x I2

0,088 x I1 = 3,0 – 0,078 x I2

I1 = (3,0 – 0,078 x I2) / 0,088

I1= 34,09 – 0,886 x I2

 

VB2 – R2 x I2 = (I1 + I2) x Rc (equação 2)

3,0 – 0,015 x I2 = 0,078 x I1 + 0,078 x I2

3,0 – 0,093 x I2 = 0,078 x I1

 

Substituindo-se na equação 2 o valor calculado de I1 na equação 1 temos:

 

3,0 – 0,093 x I2 = 0,078 x (34,09 – 0,886 x I2)

3,0 – 0,093 x I2 = 2,659 – 0,0692 x I2

0,341 = 0,0238 x I2

I2 = 14,32 A

 

Usando o valor calculado de I2 na equação 1, temos:

 

I1 = 34,09 – 0,886 x 14,32 = 21,40 A

 

A tensão na carga é dada por:

 

Vc = VB1 – R1 x I1 = 3,0 – 0,010 x 21,40 = 2,786 V ou

Vc = VB2 – R2 x I2 = 3,0 – 0,015 x 14,32 = 2,786 V ou

Vc= (I1+I2) x Rc = (21,40 + 14,32) x 0,078 = 2,786 V

 

Ou seja, há um desequilíbrio na corrente de 21,40 A – 14,32 A = 7,08 A entre as duas células, no final da descarga. Assim verificamos que na descarga, o desequilíbrio de corrente pode ser ainda maior do que na recarga.

Isso leva ao envelhecimento prematuro da célula se ela não foi projetada para lidar com essa corrente alta.

Estudos mostram que uma diferença de 20% na resistência interna das células num pack de baterias com duas células cicladas em paralelo pode levar a uma redução de aproximadamente 40% na vida útil quando comparada a duas células conectadas em paralelo com resistência interna muito semelhante.

 

Para packs de baterias com maior número de células em paralelo a diferença nas resistências internas das baterias é ainda mais crítico.

Com mais células em paralelo envelhecendo de maneira diferente, após alguns ciclos, as diferenças nas resistências internas das células será acentuada, gerando ainda mais desequilíbrio de corrente e acelerando ainda mais a perda de capacidade do pack.Portanto, antes de montar um pack de baterias, é altamente recomendável medir a resistência interna de cada célula e associar em paralelo aquelas células com tensão e resistência interna as mais próximas possíveis entre si.